Como se mais nada fosse preciso para nos sentirmos perto do Princípio, obrigado, por este tecto, por este tão inicial abrigo.
antónio colaço
O preço da opção por mantermos o espelho deste chão de madeira dos nossos antepassados está aqui:
- Aqui e acolá, silencioso, apenas denunciado pelos pequenos montículos de madeira,feita serradura, fruto da tão árdua quanto destruidora canseira, ei-lo, o bichinho da madeira roendo-nos os nervos!
Mas... a indústria preparou para eles uns banhinhos de "spray" "refrescante"!
Será que o raio dos bichos protestam pelo facto de não termos optado pela placa de betão?!
À sua silenciosa teimosia só podemos responder com uns minutos de vergada coluna, quiçá de alguma azia!
Azar o deles!
antónio colaço
E não é que as ciáticas dores parecem ter encontrado nas cálidas águas do Vale alguma amenização?
Quem não sobreviveu à ciática dos dias foram as jovens videiras, elas mesmas alvo de redobrada atenção este ano, uma vez que viram reforçados os apoios ao seu crescimento traduzido em novos arames e seus suportes.
Da meia dúzia de pés da casta de moscatel branco, disputadíssimas quando se lhes pode chegar, restam estes pedacinhos de ouro que hoje mesmo descobri.
Uma "aragem" vinda não sei de onde, como disse na altura mestre Salvador,cujos sábios braços deixaram de dar apoio ao Vale por questões de saúde, deixou ressequidos, como se vê, os pequenos bagos que despontavam para a "vida" ... em Setembro!
De todos os figos, com excepção dos chamados figos de capa rota, que já se adivinham nas figueiras vizinhas, e também os "abêberos" (mão amiga traz a caminho um exemplar da maternal figueira!) os figos pingo de mel são os de nossa eleição. Generosos, fazem-se anunciar pelas dulcíssimas lágrimas com que mendigam a nossa atenção!
Estamos atentos, senhores, façam favor.
Quer dizer, temos mais "gente" atenta a não ser que as fitas de aluminio colocadas para zarpear afastem a esfomeada passarada que não cessa de ameaçar!!
Peras, figos, maçãs, uvas....água, a Irmã Terra no seu esplendor fazendo-nos superar todas as misérias. O seu temor.
antónio colaço
Obrigado, pela água que brota da terra em abundância e é fresca e pura e desenha pérolas e corais fazendo do fundo do tanque, outra vez limpo, o mar distante que não temos mas onde serenamos muito mais.
antónio colaço
Obrigado por este final de tarde no Vale. As ressequidas hortênsias perdoaram as dolorosas e ciáticas ausências e Maria, em grande forma, como sempre, de mangueira em riste fez com que me sentisse menos triste.
E não é que as cálidas águas do tanque, como quero acreditar, os doridos músculos das pernas parecem querer recuperar?
Um Agosto bem distante dos folguedos de outros Agostos recentes.
A horta, tomada que foi pelas ervas, secas e já lavradas,sim, mas tarde e a más horas - as constantes exposições por Évora e pela Capital obrigaram a tal... - não regista os mimos de outrora, das alfaces aos pepinos, tomates, melões e mil abóboras.
Até os girassóis repousam, impacientes, nas mil e uma sementes do Verão passado, adormecidas em pequenos sacos no sótão onde escrevo.
Mas o Vale é generoso e dá-nos sempre um ar da sua graça.
Que desçam as saborosas peras e em breve os figos pingo-mel e com a meia dúzia de cachos que resistiu à "aragem" fatal, não deixaremos, sózinho e triste, o nosso querido Vale.
És Tu quem nos vale.Obrigado.
antónio colaço
Algures para as bandas da Sertã, o meu amigo Manuel Domingues, vergado ao sol escaldante de Agosto, não pára, reabilitando uma velha casa que apenas pedia, "salvem-me, não me deixem morrer, não tenho onde guardar as mil e uma histórias que entre as minhas quatro paredes vi terem lugar!O que há-de ser de mim, ruindo, parede a parede,montão de pedras, sepultando histórias sem fim!"
Fala-vos, alguém, para quem o que resta do chão que o viu nascer são a meia dúzia de carros estacionados num envergonhado parque que a CM de Gavião ali ousou erguer. Porque ao tempo, consciência e meios, ainda não podia ter e as continuadas intempéries se encarregaram de antecipar um "problema para a saúde pública" que um camarário caterpliller se encarregou de "sarar"!
A casa térrea do Largo do Espírito Santo, e todos os breves passos dados durante os meus inocentes primeiros cinco anos, está bem viva na minha memória de menino, mas quis o destino que viesse redimi-la, reabilitando, em Mação, a Casa do Bisavô Luís, bisavô de Maria, a qual, se não lhe acudíssemos a tempo, igual destino conheceria.
Dez anos passados, Manel, recordo com emoção as lágrimas que deixei soltar, sentado no sótão da casa então destelhada, tendo por única companheira, uma lua encantada, agradecida por saber que, uma vez recuperada, mais gente subiria à varanda para admirar o rendilhado do seu vestido lunar.
Recuperar Mação, Manel, foi assim como que vingar as impotentes e consumadas ruínas de Gavião.
Deixo-te, Manel, com a sala do primeiro andar e como foi bom na sua afagada madeira rolar, confirmando o acertado da decisão de rejeitarmos a proclamada placa de betão.
Passando por este chão os nossos passos acrescentam passos aos antepassados que já cá não estão.
Os tectos, as suas irregulares mas sábias linhas geométricas, a singela talha dos móveis com seus vidros guardando as louças quase nunca utilizadas, sempre à espera dos dias que virão, o tão meticuloso quanto fabuloso rendilhado das almofadas, verdadeiras obras primas das mãos que os tricotaram... e o relógio de sala, verdadeiro coração da casa, preciosa imitação do relógio que me fascinava na casa da Ta Jacinta do vizinho Ti Chamiço, em Gavião, e que constitui primeiro e obrigatório ritual de quem chega, pô-lo "a trabalhar"!
As casas recuperadas, Manel, falam connosco as tantas vozes dos antepassados, sim, mas desafiam-nos também a que nunca delas nos esqueçamos porque, garantem,são elas que nos irão lembrar aos nossos vindouros, o que de bom, e tão bem,por elas fizémos sem olhar a quem.
Força, Manel.
antónio colaço
Convenhamos, as coisas estão muito melhor.Nos últimos tempos, até, a água conseguia ser quase cristalina, a convidar-nos para que a bebêssemos, com sentida sofreguidão, como antigamente, mal chegávamos a Mação.
Para azar nosso, ou não, nos últimos dias é o que se vê.
Imagem recolhida esta manhã.
Na terra das serras prenhes de cristalinas e curativas águas, a CM de Mação trata-nos assim da ... saúde.
Às vezes apetecia mesmo ser ...rupestre, para não perder pitada do carinho e enlevo com que autarcas e afins tratam os ditos!
Nem mais uma palavra.
antónio colaço
Uma semana depois...- sim, foi na arrojada replantação do pinheiro do Paraná que tudo teve início, quer dizer, a iniciática semana teve origem neste iniciático ritual de deixar que o pobre do pinheiro, finalmente, lançasse raízes à terra - obrigado, por poder voltar ao Vale, ainda que apenas para matar saudades.
Tantos planos para lhe devolver mais frescura, tantas ideias para reencontros e convívios e, agora, já só esperar que me aguente nos debilitados tíbios, tíbias, queria dizer!!!
E as águas do tanque oferecendo-se cálidas, deixando que a noite, por mim, mergulhe nelas.
antónio colaço
Este é o meu querido amigo Mário Rodrigues, às portas do seu Centro de Massagens e Recuperação, ali para as bandas da Encosta da Barata. Há mais de um século que nos conhecemos, um dos primeiros e entusiastas ouvintes e colaboradores da desaparecida Rádio Antena Livre.
Um cidadão de corpo inteiro, bombeiro empenhado, soldado da Cruz Vermelha, também, só muito tarde descobri a sua arte de nos recuperar as mazelas do corpo.
Na sua pequena sala de espera, as paredes são pequenas para os muitos diplomas que atestam os sucessivos e continuados Cursos de Formação e actualização no domínio da chamada medicina desportiva. Não é em vão que muitos clubes da região e arredores recorrem aos seus eficazes serviços.
Foi ao Mário que mais uma vez recorri, vindo de Lisboa a poder de injecções e outras escusadas recomendações!
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O Mário poderia muito bem integrar, junto das unidades hospitalares da região, aquilo a que chamaria de "facilitadores fisioterapeutas", ou seja, gente devidamente credenciada a trabalhar em complemento com a classe médica.
Há, de facto, um lado mecânico do nosso corpo que não vai lá com paninhos!
Obrigado, Mário, por esses dedinhos!
Além do mais, quem conhece o Mário, sabe que vem de lá não só com o corpinho afinado, mas, também, com a mais completa, demolidora e actualizada agenda social no que aos usos e costumes abrantinos diz respeito!
O Mário "endireita" os corpos como poucos, mas, às vezes, pressentimos que gostaria de endireitar, também, os enviezados caminhos da nossa cidade!
Mário, obrigado, outra vez!
antónio colaço
Saíste há pouco de um Centro de Recuperação e Massagem. Não tardou que uma luzinha da viatura te encaminhasse com a máxima urgência para um ...centro outro de recuperação automóvel,vulgo "station marché",para a necessária e urgentíssima mudança de óleo( entre parentesis mais de 45mil Kms depois...)!
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Ciática,mecânica.... e assim se passaram os dois primeiros dias de férias!Longe das tão desejadas águas frescas do Vale e das tarefas que os tórridos dias nele reclamam...mas Vivo!
Digam lá que não é bom?!
antonio colaço (por tlm)
Abrantes.Pôr-do-sol no Estádio
Quase dez dias depois, obrigado, pela arte de M. em atenuar as continuadas dores ciáticas.
Tudo o que aqui foi dito como que se esboroou no momento mesmo da dor, o seu pico, aqueles momentos em que quase não há tempo para se perceber de que dor é feita a dor que sentimos e que nos tolhe a capacidade de recebê-la, compreendê-la, abrir-lhe as portas e, no entanto, há gente, há relatos de gente que consegue chegar lá, a esse ponto de "morrer antes de morrer", como que a Morte, a Irmã Morte, quase nada mais ali tenha de fazer.
Não era dessa santidade, creio, que o Pe Anselmo nos falava, por isso sinto relevada a minha fraqueza perante esses continuados dias "sem conseguir ter posição" antes, tudo querer fazer para sair da aflição, para regressar à acção!
Obrigado, pois, pela sabedoria que depositaste nas mãos de M. e que esta manhã salvou da dor um agricultor a quem um destemido carneiro "desengonçou" o braço, um operário ucraniano cujo pé terá ficado debaixo de alguma viga, para não falar do ar sorridente de um casal de meia idade a quem as mazelas ficaram curadas.
Como seriam os Teus milagres de hoje e o que nos dirias sobre este corpo e o Amanhã que o espera?
Ah!Gostei do que me segredaste, ontem, ao ter conseguido percorrer os quase 500 metros, antes da decidida intervenção de M.,hoje, para alegrar na Matriz de Mação a Tua Eucarísitica hora!
Sim, não foste muito original, mas percebi, perfeitamente, aquela do "porreiro que tenhas vindo, pá!"
antónio colaço
Confesso que ainda não vi!*
( Deve ser da continuada e terrível ciática.
Logo agora, no inicio das férias, a CIA tinha mesmo de meter-se comigo!Com a minha segurança)
antónio colaço
*Vi, na ânimo!Acreditem ou não!Parabéns e obrigado Cláudia Sebastião.Está lá tudo o que havia para dizer!Contem comigo para o que resta fazer!Quer dizer, bem feito!
Pe Anselmo Borges
IN DN,hoje
O TRABALHO E O ÓCIO
Entre as muitas características que nos distinguem dos outros animais, como a linguagem duplamente articulada, a autoconsciência, o pensamento abstracto, a orientação para o mundo como um todo e a capacidade de distanciamento da imediatidade no espaço e no tempo, a elaboração de teorias científicas, a avaliação segundo juízos morais, está também o trabalho. O homem também se define como homo faber. Karl Marx viu bem: "O homem diferencia-se dos animais a partir do momento em que começa a produzir os seus meios de vida."
Enquanto o animal colhe o que a natureza lhe oferece, o homem transforma-a. Trabalha para satisfazer as suas necessidades, estabelecendo uma relação de intercâmbio com a natureza: obtém dela o que lhe falta e, por outro lado, ao transformá-la, transforma-se a si mesmo. Mundanizando-se, o homem humaniza o mundo e humaniza-se a si próprio, autorrealiza-se. Ao mesmo tempo que elabora os produtos de que precisa, aperfeiçoa a natureza e forma-se a si mesmo teórica e praticamente.
Com a complexificação do mundo do trabalho, assiste-se à sua divisão e a uma teia, também ela complexa, de relações laborais e sociais, configuradoras da identidade própria. Percebe-se a importância decisiva desta configuração, quando se pensa em quem já não encontra trabalho e cai no desemprego: não só não tem meios de subsistência como é marginalizado, sentindo-se inútil por não contribuir para a realização do bem comum.
No trabalho, é preciso considerar um duplo aspecto. Por um lado, forma a pessoa e contribui para a realização da sociedade - deve-se pensar num sentido abrangente do trabalho: trabalha o agricultor, o construtor, o engenheiro, o médico, o professor, etc. -, mas, por outro, o trabalho apresenta-se como fardo e castigo, como diz a próprio étimo: tripalium, instrumento de tortura.
Neste contexto, aparece o ócio, que provém do latim otium, vinculado a scholê, no grego - é daqui que provém escola. Aqui, ócio significa estar livre dos negócios da política e das actividades económicas, para poder dedicar-se à contemplação, à festa, à alegria e à busca da verdade. Como diz Platão, os filósofos "desfrutam do tempo livre e preparam os seus discursos em paz e em tempo de ócio. Apenas os preocupa alcançar a verdade". Vemos aqui a síntese da importância que Platão atribuía ao ócio, vinculando-o à liberdade (ter tempo livre e ser livre), à verdade, que deve ser procurada sem a pressão do tempo, e à filosofia enquanto procura livre da verdade.
A questão, na antiguidade, é que só os livres se podiam dedicar ao ócio da liberdade, pois os escravos encarregavam-se das tarefas materiais - aliás, ainda hoje, nos preceitos da Igreja se fala em "trabalhos servis". Por isso, Aristóteles viu bem que era necessário o bom governante criar condições para a contemplação, observando que o tirano procura que ninguém tenha ócio.
Na modernidade, esbate-se o espírito da verdade como contemplação, para vincular ciência, domínio da natureza e utilidade. Francis Bacon marca essa viragem: "o que é mais útil na prática é ao mesmo tempo o mais verdadeiro na ciência" e: "scientia est propter potentiam" - a ciência é por causa do domínio. E, lentamente, com a segunda revolução industrial, chegou-se ao oxímoro da "indústria do ócio".
Onde está o predomínio: no trabalho ou no ócio? Como conclui Gabriel Amengual, inspirador deste texto, se se puser o acento no trabalho, então o ócio pode tornar-se um simples meio para o trabalho - descansar para recuperar forças e trabalhar, como se o homem fosse feito apenas para produzir e trabalhar. Se o decisivo for o ócio, então o trabalho acaba por ser considerado negativo e frustrante, pois é puro negócio, negação do ócio, e paradoxalmente, o ócio não passa de "compensação para a frustração do trabalho".
Afinal, trabalho e ócio são complementares e o homem tem de ser visto de modo harmonioso e pleno, nas sua múltiplas dimensões: "A dimensão laboral e cultual-cultural, social e pessoal, activa e contemplativa, produtiva e artística, a dimensão do dever e a do desejo, a determinação e a liberdade."
A ânimo deseja a todos os seus leitores óptimas férias!
Pedimos ao Ton Koopman uma coisinha leve, de Bach, e, de imediato, se solidarizou connosco!
Adeus, Ton, a gente volta a ver-se um destes dias, quem sabe... já amanhã!!!
antónio colaço
Caro António Colaço
Depois de algum prolongado silêncio as palavras justificam-se para dizer que a lembrança tem permanecido o contrario da indiferença. Estive, faz algum tempo, doente e assustado, julgando que tinha algo complicado, mas afinal o que me atormentava, com temperatura fora do normal, era uma infecção urinária. Feitos os tratamentos e as análises recomendadas pelo médico as preocupações passaram.
Não quero falar mais de mim, mas de si, ou a propósito, porque, em abono da verdade, não o conhecendo bem, mas o suficiente, considero-o um amigo e respondo à sua carta, dirigida aos seus 57 leitores da ânimo. Não me considero um deles, na medida em que não sou assíduo, embora na minha esporádica curiosidade valorize o que escreve e mostra.
Fiz já um percurso por Mação e gostaria de lá voltar e almoçar no restaurante Casa Velha.
Não conheci a versão da ânimo em offset, apareci depois, foi você que me reconheceu e agradeço-lhe o gesto, que permitiu a minha participação com gosto na exposição colectiva na Galeria Municipal de Abrantes.
Agradeço-lhe a atenção e acredite que de vez em quando o recordo e penso que um dia possamos estar juntos com tempo para falarmos sobre tantas coisas. Com a sua experiência e saber não perderei o meu tempo, mas valorizemos o afecto, também. Afecto eu tenho por António Feio e nunca falei com ele, aproveitando para partilhar consigo o que escreveu a propósito do falecimento desse homem de cultura, uma perda para o pais. António Feio através do humor fazia passar coisas muito sérias.
Como sabe sou um artista plástico que escreve, e a poesia é o meu modo de escrita mais compreensiva depois da pintura. Assim, para si, amigo António Colaço, dedico-lhe um poema que fará parte de um próximo livro:
Amigo especial
Vê-me de costas
contrário da luz
não me olhes de frente
porque perturbas-me
dentro o meu lado
luminoso que trago
ao passar pela lua
ou rente a candeeiros.
Vê-me de longe
ou perto do ouvido onde
a espiral leva-me
a prender-te aos meus
segredos que guardo
para os amigos
e tu podes ser um
muito especial.
Um abraço
Emerenciano
NR
Uma dolorosa ciática distraíu-nos, daí que só hoje arranjássemos ânimo para agradecer a sua atenção. Rejubilamos pelo regresso da saúde, quem sabe se das dores não terão nascido já, novas cores?!Grande abraço e muito obrigado.ac
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