Sábado, 10 de Outubro de 2015
WEBANGELHO SEGUNDO ANSELMO BORGES

18313714_2tdsj.jpg

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Casamento católico: indissolúvel?

por Anselmo Borges

In DN<input ... >

 

1. A família estável, no amor fiel e para sempre, é célula de base da sociedade e da Igreja, valor essencial pelo qual vale a pena bater-se, tanto mais quanto é o espaço ideal para ter filhos e educá-los, porque ali se junta o afecto e a autoridade. A desestruturação da família afunda a sociedade. Mas a vida é o que é. O próprio Papa Francisco, embora evitando a palavra divórcio, veio reconhecer que a separação pode ser "moralmente necessária". No caso da violência doméstica, por exemplo: "Quando se trata de proteger o cônjuge mais frágil ou as crianças das feridas mais graves causadas pela violência."

Há quem pretenda resolver o problema mediante a rapidez e a simplificação nos processos de nulidade. Excelente medida, e Francisco acaba de decretar nesse sentido. Mas não resolve tudo. Porque há casamentos válidos que, por culpa de um ou do outro, por culpa dos dois ou de nenhum, simplesmente fracassam. A realidade pessoal não é reificada, imóvel, mas dinâmica, processual: somos sempre nós, mas em mudança, e frágeis. Lá está sempre Pascal: "Ele já não é o mesmo, ela já não é a mesma; se fossem os mesmos, ainda se amariam." E se, depois, refizerem a vida no amor e resolveram de modo justo os problemas do casamento anterior e vivem na fé, na qual educam os filhos, devem ser excluídos da comunhão na Eucaristia? Já aqui explicitei suficientemente que não.

 

2. Mas há quem vá mais longe, de modo seriamente argumentado. O teólogo José María Castillo, que estudou o assunto durante anos, na companhia de outros teólogos, como pode ler-se na Civiltà Cattolica, dos jesuítas, dirime a questão nestas três afirmações: "O Papa pode admitir à Eucaristia os divorciados que voltam a casar-se"; "não é doutrina de fé que o casamento cristão seja indissolúvel"; "o divórcio era uma prática admitida na Igreja dos dez primeiros séculos".

Quanto ao casamento, é sabido que os cristãos, ao princípio, seguiam os condicionamentos e costumes do mundo ambiente, sublinha o teólogo, que vou seguir quase textualmente. Esta situação durou pelo menos até ao século IV. Durante os dez primeiros séculos, não estava generalizada a ideia de que o casamento fosse um sacramento. A teologia do casamento como sacramento foi sendo elaborada nos séculos XI e XII, o que aparece em Pedro Lombardo e no Decreto de Graciano, mas tanto Pedro Lombardo como Hugo de São Victor colocam o núcleo do casamento não no rito sacramental, mas na "união dos corações". Tudo isto explica a razão por que o papa Gregório II, em 726, respondeu a uma pergunta do bispo São Bonifácio sobre o que devia fazer o marido cuja mulher tinha caído doente e, por causa disso, não podia dar-lhe o débito conjugal: "Seria bom que tudo continuasse na mesma e se entregasse à abstinência. Mas como isto é de homens grandes, quem não se puder conter que volte a casar-se; mas não deixe de ajudar economicamente a que caiu doente e não ficou excluída por culpa detestável". Que o divórcio era prática admitida na Igreja dos dez primeiros séculos consta numa resposta do papa Inocêncio I a Probo. O que se passa é que durante este tempo a Igreja assumiu como seu o direito romano, que Santo Isidoro, no Concílio de Sevilha, no ano 619, proclamou como lex mundialis (lei mundial); ora, no direito romano, a dissolução do casamento era perfeitamente admitida. A doutrina do Concílio de Trento sobre esta questão não é dogma de fé: o cânone 7 foi redigido de modo moderado, considerando a Igreja Ortodoxa grega, que admitia o divórcio, coisa que o Concílio não quis condenar.

 

3. Outros teólogos, como José Arregi ou Hans Küng, vieram chamar a atenção para o Novo Testamento. Fosse qual fosse o ensinamento de Jesus, o Evangelho de São Mateus (5, 32) reconhece pelo menos uma excepção na proibição do divórcio: em caso de porneia (união ilegítima), seria legítimo divorciar-se e voltar a casar-se. E São Paulo, na Primeira Carta aos Coríntios (7, 15), com o chamado "privilégio paulino", também reconhece que, no caso de um casamento misto, se o não crente quiser separar-se, a parte crente fica livre para voltar a casar-se. No quadro desta lógica, o Papa Francisco, no seu recente motu proprio, apresenta como uma das causas de nulidade a falta de fé, como sugerira Bento XVI. Pergunto: e a falta de amor, quando o casamento se torna um inferno?



publicado por animo às 11:58
link do post | comentar | favorito

pesquisar
 
Março 2018
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3

4
5
6
7
8
9
10

11
12
13
15
16
17

18
19
20
21
22
23
24

25
26
27
28
29
30
31


posts recentes

DA ARTE E DOS ESPAÇOS INE...

OBRIGADO, MANUEL

ANTONIO COLAÇO NO "VOCÊ N...

PE ANSELMO BORGES NOS ANI...

ANA SÁ LOPES NOS AAAANIMA...

ANA SÁ LOPES NOS ANIMADOS...

O OUTRO LADO DO AAANIMADO...

LISBOAS

CHEF PEDRO HONÓRIO OU AS ...

BALANÇO FINAL . JOAQUIM L...

REGRESSARAM OS AAANIMADOS...

IN MEMORIAM ANTÓNIO ALMEI...

PE ANSELMO BORGES NÃO TE...

MINISTRO CAPOULAS SANTOS ...

WEBANGELHO SEGUNDO ANSELM...

CARDIGOS, AS CEREJAS E O ...

trip - ir a mundos onde n...

´WEBANGELHO SEGUNDO ANSEL...

ANDRÉS QUEIRUGA EM PORTUG...

WEBANGELHO SEGUNDO ANSELM...

arquivos

Março 2018

Fevereiro 2018

Janeiro 2018

Outubro 2017

Junho 2017

Maio 2017

Abril 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Agosto 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

tags

todas as tags

links









































































































































































































subscrever feeds